sábado, 24 de outubro de 2015

Quando a internet se torna tóxica: #primeiroassédio



Não foi nada fácil estar no Facebook durante esta semana. Choveu notícia ruim, uma após a outra. Direitos das mulheres sob o próprio corpo sendo restringidos pelo Estado, crianças sendo hiperssexualizadas nas redes sociais, crianças sendo hostilizadas, homens fazendo "piadas" sobre estupro e pedofilia. Um verdadeiro show de horrores.

Foi Cunha conseguindo votar PL que é sinônimo de retrocesso no que diz respeito aos direitos das mulheres vítimas de estupro. Foi garota do MasterChef Jr sendo hiperssexualizada nas redes sociais, teve também garoto do mesmo programa tendo sua possível homossexualidade hostilizada e nenhuma pessoa é punida. E outro também foi vítima de ataques pedófilos feitos por homens e mulheres. E, no meio disso tudo, ainda teve vários homens fazendo piada da situação.

Diante da situação de assédios contra uma das participantes do MasterChef Jr, uma das integrantes do coletivo Think Olga decidiu criar a hashtag #primeiroassédio, que gerou cerca de 29 mil compartilhamentos no Twitter, com mulheres de diversas idades, que relataram como aconteceu seu primeiro assédio. Um número absurdo, porém longe da realidade, pois a realidade ainda é pior, caso analisemos a quantidade de meninas que são obrigadas a conviverem com o agressor, porque ele é o pai, irmão, tio, avô e por isso não pode expor o assédio/abuso. E ainda temos as meninas que sequer possuem acesso à internet, ou que possuem uma culpa tão internalizada que não sabem que foram vítimas.

Porém, diante de tudo o que aconteceu, as piadas foram o que mais me incomodaram. Vi vários homens relativizando os assédios e abusos, outros fazendo chacota e muitos outros atribuindo a culpa dos crimes às vítimas, tudo isso em nome do “humor”. É complicado passar por uma situação do tipo, saber que parte da família me culpou e ver que milhares de pessoas – a maioria homens – ainda têm o mesmo tipo de pensamento retrógrado e tão século XX. É triste ver cantor “famoso” esbravejando no Twitter que tudo isso não passa de uma grande brincadeira para os homens. De que a empregada dele, quando ele tinha 10, deixou que ele tocasse os seios dela. E lendo depois que o próprio cantor já foi acusado de estupro. Talvez, por isso, que pra ele seja tão engraçada toda a situação.

Crescer com um trauma desse tipo não é nada legal e muito menos engraçado. É perturbador saber e lembrar de coisas que lhe forçaram a amadurecer mais cedo do que outras garotas. É triste saber que sua mãe ainda se sente culpada por algo que ela não teve como prever, que ela nada pôde fazer para evitar. Nada disso é engraçado. Não é engraçado passar por um abuso ainda criança e ter de sofrer com assédios na rua mesmo antes de entrar na puberdade. Com 10, 11 anos, homens já me assediavam na rua e eu não sou exceção. Nós, mulheres, passamos por isso desde crianças e ainda há quem ache graça.


Por fim, eu já suportei e ainda suporto muito coisa nesta vida, mas “piada” sobre pedofilia e estupro é o cúmulo do absurdo e da falta de empatia com a dor alheia. É doloroso demais ler algo do tipo, mesmo sabendo que não foi direcionada a mim exclusivamente. Mas eu fui uma vítima, então a “piada” só funciona como um tiro, que só faz com que eu perceba que os homens, em sua maioria, ainda nos veem como algo inferior. Para a maioria deles, ainda não valemos nada.

domingo, 18 de outubro de 2015

Fé, amor, paz e sabedoria

Foto: Talita Barbosa

Uma pausa na conclusão do TCC para poder registrar em palavras a minha experiência ao entrar num terreiro de candomblé pela primeira vez em 22 anos de vida. Até tenho um avô pai de santo, mas, talvez, por não ser próxima dele que o meu contato com a religião não tenha se estreitado antes.

No ensino médio estudei muito sobre os orixás, lembro-me de ter feito um trabalho sobre algum deles e me deliciado com as histórias e os significados das coisas. Tenho uma queda por Iansã desde que a conheci e não sei explicar. Identifico-me e muito com a história, características e cores relacionadas ao orixá. Apesar de não ter um gênero definido, gosto de acreditar que Iansã seja uma mulher negra guerreira.

Pois bem, o estágio na Secretaria de Cultura sempre me proporciona coisas boas. Aprendi muito em pouco menos de um ano. Aprofundei meus conhecimentos em jornalismo e aprendi muito no que diz respeito à cultura da minha cidade e estado, também amadureci muito. No início do ano, pude participar do seminário da Renafro sobre religiões afro-brasileiras e saúde no que tange o direito da população de terreiro e o respeito a sua ancestralidade.

Mas, ontem, 17 de outubro de 2015, pude entrar num terreiro e perceber que tudo o que eu ouvi durante toda a minha vida não passa de uma caricatura mal feita e racista das religiões de matriz africana. Ouvi tambores tocar e o povo dançar alegremente ao poderem cultuar seus orixás sem serem importunados por cristãos fundamentalistas, que acreditam piamente que apenas a sua religião levará a salvação. E que, erroneamente dizem que Exu é o diabo e chamam os candomblecistas de macumbeiros de forma pejorativa.

Ao contrário do que eu costumava ouvir de alguns pastores oportunistas, o terreiro foi um lugar que emanou paz e sabedoria. O respeito à tradição que é passada oralmente, através dos séculos, num sistema hierárquico respeitado por todos os adeptos, é algo que deveria ser adotado por todos. A importância que é dada aos mães e pais de santos, o respeito a sabedoria ancestral, o respeito à natureza e tudo que dela é derivado.

Por fim, fiquei encantada com as cores, com os tambores, com os cânticos e com a alegria. Observei atentamente cada detalhe e não consegui enxergar a maldade que tanto falam por aí. Só consegui enxergar amor, respeito e muita sabedoria.


Axé pra quem é de axé